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Quer liderar uma empresa inovadora e competitiva? Invista na diversidade
Entenda por que diversidade e inovação são dois conceitos que caminham lado a lado nas empresas
Há 13 anos, a jornalista boliviana Roxana Cazón veio ao Brasil tentar um transplante de rim. Estrangeira, não tinha sequer direito a um lugar na fila de espera e, enquanto aguardava uma solução, acabou fixando moradia no país. Passou a viver em Ribeirão Preto (SP) e conseguiu emprego como repórter de um site jurídico.
Além de não dominar o idioma, ela precisou aprender um dialeto desconhecido para a maior parte dos brasileiros. “Era difícil porque eu não sabia falar o idioma, mas aprendi bastante, principalmente por estar lidando com textos jurídicos que têm a forma mais culta do português”.
No entanto, sua experiência e background únicos são úteis tanto para a sua carreira no Brasil quanto para a empresa onde atua: por ser falante nativa do espanhol, ela fica responsável pela cobertura das pautas jurídicas que envolvem a América Latina.
Como essa, existem várias outras histórias que mostram como a competitividade dos negócios está atrelada diretamente às políticas corporativas de estímulo à diversidade e equidade dentro das organizações.
A reportagem do Administradores.com analisou estudos e experiências de empresas e profissionais que apontam para uma só conclusão: diversidade e inovação são dois conceitos que caminham lado a lado nas empresas.
Estudos mostram que, para tornar o ambiente de trabalho propício à inovação, é necessário construir equipes de pessoas com opiniões, ideias, contextos e experiências diferentes.
Isso acontece não apenas porque é interessante ouvir e atuar com pessoas que pensam diferente, mas também porque, comprovadamente, um ambiente de trabalho mais diverso resulta em um aumento significativo da produtividade e inovação.
Diversidade e inovação: o que mostram os dados
A consultoria Accenture, dirigiu uma pesquisa que foi divulgada neste ano onde comprova que a mentalidade de inovação é seis vezes maior em empresas mais diversas e com cultura de igualdade mais forte do que nas que não investem no quesito.
O estudo Getting to Equal 2019: Creating a Culture that Drives Innovation da Accenture, comparou não só os efeitos da diversidade cultural quanto também da de gênero e étnica entre 18.200 funcionários de empresas em 27 países. Foram entrevistados, também, 152 executivos de alto escalão em oito países para compor os números.
Sobre inovação, os funcionários que assinalaram a alternativa “nada me impede de inovar na empresa” foi de 40% naquelas com políticas de diversidade. Já nas que têm um certo grau de diversidade (classificadas como típicas) foi de 21% e nas que são menos igualitárias, a taxa de resposta ficou em 7%.
Aqueles que trabalham nas empresas mais diversificadas também têm menos medo de errar: 80% deles disseram não temer a falha enquanto buscam inovação. Comparando com os outros dois graus de empresas, 56% dos funcionários das típicas deram a mesma resposta e apenas 36% das menos igualitárias é que não têm medo de errar ao tentar inovar.
Segundo o levantamento da Accenture, companhias que equilibram a diversidade e promovem a igualdade, têm uma consciência de inovação onze vezes maior do que naquelas que não dão a mesma atenção a ambos os fatores.
O relatório Delivering through Diversity, realizado e divulgado pela McKinsey em 2018, atestou que empresas de alta performance que investiram na diversidade de gênero tiveram lucro 21% maior, em 2017, do que aquelas que não tiveram o mesmo cuidado. As que buscaram também ter um ambiente mais diverso etnicamente, obtiveram um resultado 33% maior.
Esses dados foram coletados em mais de mil empresas espalhadas em 12 países (incluindo o Brasil), onde foram quantificados não só os lucros, mas também medidas de longo prazo, tais como a produtividade dos funcionários.
Estímulo à igualdade como política nacional
A Austrália era o país que liderava nas políticas de equidade de gênero — ou seja, que buscam um quadro funcional mais justo e balanceado entre homens e mulheres — no ambiente de trabalho, entre os países pesquisados.
Lá, a média é de 30% de mulheres em todo o quadro funcional, enquanto entre os cargos executivos, as mulheres ocupam 21% desses cargos.
Quanto ao país mais justo em relação à diversidade étnica, a África do Sul foi o primeiro colocado. Cerca de 16% dos cargos executivos são ocupados por negros. No entanto, a ironia cabe ao censo do país: 79% da população é negra.
Eles são contados como minoria por conta do histórico sul africano de políticas racistas ao longo do século passado, o apartheid (encerrado, politicamente, em 1994), que distanciou a população negra dos cargos mais importantes nas empresas e no governo.
O próprio governo criou o programa de Empoderamento da Economia Negra (Black Economic Empowerment, BEE, em inglês), implantado em 2003 e atualizado em 2007 após uma série de críticas relacionadas à sua estrutura de benefícios.
O BEE determina que 1% do lucro líquido das companhias baseadas naquele país seja retornado à comunidade através de um Investimento Social Corporativo (CSI, na sigla em inglês), onde pelo menos 75% dos beneficiários devem ser não-brancos. Além de medidas para maior inclusão dos negros no quadro funcional e no controle das empresas.
O relatório da McKinsey não traz os dados detalhados do Brasil, apenas demonstra que nosso país e o México foram os únicos pesquisados da América Latina e ajudaram a completar os números apresentados.
O que acontece no Brasil?
Por mais que a pesquisa apresentada anteriormente não traga os números brasileiros, o Instituto Ethos em conjunto com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), publicam periodicamente dados sobre a diversidade dentro das empresas no país.
O Perfil Social, Racial e de Gênero das 500 maiores empresas do Brasil e suas ações afirmativas, de 2016, revela que 71,8% dos negócios pesquisados não têm incentivo à participação das mulheres. Enquanto 88% deles não incentivam a participação dos negros.
Quando expandimos o entendimento de diversidade para as pessoas com deficiências, segundo o Instituto Ethos, 56,9% das 500 empresas pesquisadas não têm incentivos à sua inserção. Já o incentivo à participação de pessoas com 45 anos ou mais não existe em 90,6% dessas empresas.
Sobre as mulheres, especificamente, foi publicado, no dia 22 de maio deste ano, um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A pesquisa Women in Business and Management: the Business Case for Change traz dados de 70 países e quase 13 mil empresas.
Segundo ela, em 2016 o Brasil estava em 16º lugar entre os 25 países da América Latina e Caribe que foram pesquisados em relação à porcentagem de mulheres em altos cargos de gerência. O país tem uma taxa próxima de 20% nesse quesito.
No entanto, em termos de ascensão de carreira e os caminhos para a liderança entre as mulheres, o Brasil é considerado um ambiente “saudável” para a OIT. O levantamento separa os cargos entre “funcionárias no geral”, “cargos de gerência” e “cargos de gerência médio ou sênior”.
As mulheres ocupam cerca de 43% dos cargos nas empresas pesquisadas, sendo a maior parte delas em cargos considerados de “gerência” e há uma diferença pequena entre esse número e o das mulheres em “cargos de gerência médio ou sênior”, colocando o Brasil em um patamar positivo de ascensão de cargos entre as mulheres — mas que ainda pode ser melhorado.
Diversidade gera valor e lucro
Os números trazidos pelo relatório do Instituto Ethos, que ilustram com mais detalhes a realidade brasileira, vão de encontro a uma conclusão comum em todos os estudos analisados pela reportagem: as empresas, a sociedade e a economia como um todo são beneficiadas com um ambiente mais diverso.
O estudo da OIT, por exemplo, também aponta que empresas com mais mulheres na liderança registraram aumentos nos lucros de 5% a 20%. Enquanto 54% das companhias observaram melhoras na criatividade, inovação e reputação por essa agenda mais equilibrada quanto ao gênero.
Sócio-fundador da um.a #diversidadecriativa, agência especializada em eventos, campanhas de incentivo e trade, Ronaldo Ferreira, diz que apostar em diversidade nas empresas significa deixar “mais fácil entender e atender os desejos de consumo dos clientes”.
“Quando a diversidade está inclusa no negócio, a empresa consegue criar mais e novas ideias para os desafios do dia a dia. Desta forma, ela muda e evolui naturalmente mais rápido que os seus concorrentes. Também quando as diferenças estão presentes no ambiente corporativo, até a tomada de decisão é mais precisa, evita-se o desperdício de tempo e de recursos”.
Ao investir em um ambiente mais diverso e com um câmbio maior de conhecimentos e diferentes contextos entre pessoas, o clima organizacional, a retenção de talentos, otimização dos recursos e resultados financeiros são positivos e sustentáveis.
Confirmando os dados do Instituto Ethos, Ferreira ainda conta que há uma demanda maior, hoje, de diversidade dentro das empresas “mas, infelizmente, faltam ações afirmativas para que o ambiente se transforme em algo diverso e inclusivo. Faltam processos às empresas assim como falta atitude por parte dos colaboradores”.
Um caso trazido pela pesquisa da Accenture é o da empresa de pagamentos MasterCard. O presidente e CEO da companhia, Ajay Banga, acredita não só numa cultura de gestão mais linear quanto mais aberta às diferentes perspectivas.
Citado no relatório, ele afirma: “se você está rodeado por pessoas que parecem com você, andam como você, falam como você, foram às mesmas escolas que as suas e tiveram as mesmas experiências, você vai ter o mesmo ponto cego que eles. Vai perder as mesmas tendências, pontos fora da curva e oportunidades”.
Empresas e profissionais veem benefícios concretos na diversidade
A diversificação do quadro funcional é realidade em várias empresas. Companhias que lidam com negócios além das fronteiras brasileiras têm muito a se beneficiar com o fator diversidade étnica, por exemplo.
A empresa de pagamentos PayU, por meio do country manager Eduardo Hansel, afirma ser composta por 21 nacionalidades, o que a permite ter sucesso nos 18 mercados em que atuam, lidando com diferentes problemas, através da gama de pensamentos, conhecimentos, habilidades e visões de mundo presentes na companhia.
Hansel afirma que a heterogeneidade é a resposta para a inovação e o crescimento da PayU. “Tendo isso em mente, conseguimos potencializar a riqueza de toda essa diversidade e, concretamente, obter um ganho expressivo em velocidade de resposta, em criatividade e eficiência em escala", conta.
"Se você busca resultados diferentes, não pode continuar pensando e agindo sempre da mesma maneira. É impressionante como essa pluralidade torna nosso trabalho visivelmente mais dinâmico e ágil, com resultados mais competitivos”, complementa.
Trazendo para termos pragmáticos, ele diz que a companhia alinhou as equipes da América Latina, Centro e Leste Europeu para promover um intercâmbio contínuo dentro da empresa. Isso através de uma comunicação 100% digital que promove encontros, feedbacks e conversas entre os funcionários. “Com isso, em seis meses obtivemos um ganho de 30% em produtividade”, pontua.
Quando temos uma equipe diversificada, conseguimos formar um time que experimenta e vê o mundo de formas diversas. Com gestores dispostos a ouvir, oferecendo ferramentas e um ambiente que favorece a autonomia, a inovação surge de forma orgânica, rápida e, consequentemente, notamos pessoas mais realizadas”, explica Hansel.
Políticas de inclusão, igualdade e diversidade trazem benefícios claros a negócios globais e que precisam tomar decisões que levem em considerações culturas diferentes. No entanto, o reflexo dessas medidas é também e, majoritariamente, interno, no quadro funcional da empresa.
Como aponta Ronaldo Ferreira da um.a #diversidadecriativa: “o impacto [da diversidade] é total, pois em uma empresa quem negocia são as pessoas e elas negociam com parceiros e fornecedores que também são pessoas, tudo isso para atender clientes que são igualmente seres humanos. Ou seja, ou a gente entende de gente, ou não vamos saber fazer bons negócios”.
“O fato de ser mulher fez com que eu tomasse atitudes e posturas diferentes ao longo da minha carreira”
A frase acima é de uma mãe de dois filhos e diretora jurídica de uma multinacional. Bianca Poffo, 36 anos, trabalha na Logicalis há mais de cinco anos e contou ao Administradores.com sobre momentos-chave em sua carreira onde o machismo a colocou em situações delicadas.
Poffo conta que muitas vezes ela era a única ou uma das poucas mulheres nas reuniões, e uma das pessoas mais jovens também, o que a fez ter mais cuidado em relação à postura dela nesses momentos. O que, segundo ela, fez com que ela criasse uma “casca” tanto na aparência quanto no comportamento.
“Antigamente, costumava fingir que não ouvia comentários e brincadeiras “inadequados” ao longo de reuniões. Porém, hoje em dia temos mais força para falar, travar e até mesmo confrontar este tipo de postura”, afirma Bianca Poffo.
Hoje, diretora jurídica na empresa, ela conta que não sente mais diferença no tratamento quando comparada aos seus pares do sexo masculino. Por outro lado, ela enxerga a diversidade como um fator enriquecedor para o ambiente de trabalho e afirma não ver pontos negativos na pluralidade de pensamentos.
“É possível perceber a diversidade em meu ambiente de trabalho, tanto em termos de diversidade de gênero quanto de diversidade no geral. Mas acho que temos ainda um longo caminho pela frente. É um momento de aprendizado para a sociedade e isso se reflete dentro das empresas”, conclui.